sábado, janeiro 14, 2006

Ratos de laboratório


É impressionante a quantidade de pessoas que tentam subir ao contrário as escadas rolantes da estação de metro do Campo Grande. Com efeito, existem duas escadas rolantes, lado a lado, que dão acesso ao cais. Basta ver o espaço existente entre cada escada rolante (milímetros) para se perceber que não há qualquer separação entre os dois cais. Qualquer macaco de inteligência mediana perceberia que basta saltar para a escada rolante que sobre, e, uma vez lá em cima, virar para o lado direito ou esquerdo, conforme se pretenda ir para a linha verde ou para a amarela, respectivamente. Ainda assim, são várias as pessoas que, após uns segundos de hesitação, tentam subir a escada rolante que desce (!!!!), incapazes de raciocínio tão simples.

Faz-me isto lembrar outra situação que, embora menos grave, não deixa de pôr em causa algumas das ideias feitas sobre a inteligência humana por oposição à dos animais ditos irracionais.

Há em Santa Cruz três paragens de autocarro, contando com a de partida. Como esta se situa em frente ao acesso de algumas das praias mais frequentadas, é nela que se concentra a maioria das pessoas, ao fim da tarde. Assim, é muito frequente o autocarro já não parar nas outras paragens, por ter enchido logo na primeira. Isto acontece quase sempre ao fim da tarde, sobretudo ao Domingo. Tendo isto em consideração, parece-me que seria da mais elementar lógica as pessoas concentrarem-se na primeira paragem, nas alturas de maior enchente, e evitar pelo menos a segunda, que fica a pouco mais de 200 metros. É que é demasiado óbvio que uma pessoa que se dirija à primeira paragem às 17:55, por exemplo, terá muitíssimas mais hipóteses de apanhar o autocarro das 18:00 do que a pessoa que está na segunda paragem desde as 17:05. Mas nem sempre a mente humana é lógica... Comecei a dar-me conta disso uma vez em que o autocarro, como quase sempre, não parou na segunda paragem, ao fim da tarde. Olhei pela janela e vi a expressão de desalento de muita gente, acompanhada de esbracejamentos vários, ao verem que teriam de experar pelo próximo. Tive pena delas, e senti algum remorso, pois tinha chegado à primeira paragem mesmo em cima da hora, e muitas daquelas pessoas tinham ar de estar ali há muito tempo. No dia seguinte, o autocarro não parou de novo, como era óbvio. Reparei que muitas das pessoas que faziam um ar de espanto indignado por o autocarro não ter parado eram as mesmas do dia anterior. Passei então a olhar pela janela quando, àquela hora, o autocarro passava sem parar (sempre). Notei, estarrecido, que as pessoas que esbracejavam indignadas pela não paragem do autocarro eram sempre as mesmas. Novos, velhos, homens, mulheres. Não entendo. Ultrapassa-me. Mas será que é tão difícil para aquela gente perceber que o autocarro àquelas horas nunca pára ali? Independentemente de ser justo ou não, não deveriam já ter percebido isso, logo à segunda ou terceira vez? Por que raio ainda là estavam, ao fim de uma, de duas semanas, a esbracejar de espanto indignado por o autocarro não parar? Não serve como justificação a outra paragem ser longe, e as pessoas estarem cansadas: a primeira paragem fica a cerca de 200 metros - se tanto. De qualquer forma o que me escandaliza é o ar de espanto das pessoas, como se ao fim de uma, duas semanas não fosse já demasiado previsível que o autocarro não ia parar. Até um rato de laboratório o saberia.

Uma das coisas que distinguem, dizem os cientistas, o homem da generalidade dos outros animais é o ser capaz de aprender com os erros e a experiência, e a capacidade de reagir a novas situações. As pessoas que sobem escadas rolantes ao contrário e as que esperam pelo autocarro que obviamente nunca vai parar ali àquela hora ainda não foram informadas disso.

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