quarta-feira, abril 28, 2010

Das opções

Trabalhar a ouvir Corelli no Mezzo é uma péssima ideia. No entanto, se tivesse de optar entre as cada vez mais insuportáveis intrigas vaticânicas seiscentistas e a música barroca sei que não precisava sequer de pensar. Por isso, e porque este maldito doutoramento tem mesmo de ser cuspido rapidamente, lá terei de trabalhar a ouvir Corelli no Mezzo.

Das Senhoras do Caravaggio

Gostava de que os saudosistas do Scolari e da Sr.ª do Caravaggio explicassem como é que a selecção da Federação Portuguesa de Futebol chega ao 3.º lugar do ranking da FIFA sem o dito cujo e sem a dita cuja.

terça-feira, abril 27, 2010

______to stand(alone)in some

____ autumnal afternoon:
___ breathing a fatal
__ stillness;while

_ enormous this how

_patient creature(who's
never by never robbed of
_day)puts always on by always

_ dream,is to

___taste
____not(beyond
_____death and

______life)imaginable mysteries


e. e. cummings, 95 poems
Liveright, 2002

domingo, abril 25, 2010

Madrugada


25 de Abril

Esta é a madrugada que eu esperava

O dia inicial inteiro e limpo

Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo

Sophia

sábado, abril 24, 2010

Da colheita da Verdade


Nos 'meus' documentos do Arquivo Secreto Vaticano, um autor português responde ao um espanhol, no contexto da guerra diplomática que se seguiu à Restauração de 1640:
(...) ipsum tabellarium a Te adductum diligenter inspiciemus, ut mundo pateat quod Tu ex luce nebulas, non autem ex nebula lucem emergere facis, et ad instar illius emblematis unius floris in quo considentes apem et araneum iste uenenum, et altera uero mel haurit, Tu non solum e Tabellario, sed ex omnibus scripturis uenenum mendacii, et ambagum non autem ueritatis mel expromere curas.

O que é como quem diz, em linguagem:

(...) examinemos atentamente o próprio tabelário por ti aduzido, de modo a que fique patente ao Mundo que tu fazes nascer da luz as névoas, não da névoa a luz, e à semelhança daquela imagem de uma flor, na qual estando uma abelha e uma aranha, esta sorve veneno, a outra mel, tu tratas de retirar não só do tabelário, mas de todas as escrituras, o veneno da mentira e das ambiguidades, mas não o mel da verdade.


Toma lá que é para aprenderes.

Do infantil politicamente correcto

Com as recentemente adquiridas funções de tio e as suas agregadas obrigações de contador de histórias e cantadeiro, tenho notado que as histórias e canções infantis têm sofrido um processo de revisão politicamente correcta. Assim, por exemplo, na história do Capuchinho Vermelho o lobo já não come a avó, e o caçador já não lhe abre a barriga (ao lobo) para a encher de pedras, como no meu tempo. Agora a avozinha foge e esconde-se no armário, enquanto o caçador se limita a enxotar o lobo. Perdeu a graça toda. Na história do João e da Maria, os meninos em algumas versões já não são abandonados, antes se perdem sem que se perceba muito bem porquê. A bruxa continua a ser metida no forno, mas desconfio que também isso venha a mudar.

Agora acabo de ouvir uma menina a cantar o clássico "atirei o pau ao gato". Ainda cantou a versão que eu sempre conheci. Mas a mãe ia cantando ao mesmo tempo, e insistindo nas correcções politicamente correctas que tornam a canção impossível de cantar, e que a filha ia rejeitando (abençoada). A nova e absurda versão por enquanto ofende apenas os dois primeiros versos, e é assim: "atirei o carapau ao gato mais o gato não comeu".

:|

quarta-feira, abril 21, 2010

Dos javardos

De modo a conseguir trabalhar na faculdade sem ser perturbado, pedi à Ana que me deixasse ir com ela para o Anfiteatro I, onde ela ia (está a) dar aula. Não está a funcionar. Alunos a conversar como se estivessem no café, outros a entrar e sair constantemente. Nunca vi tanta má criação junta. Esta gente não tem a noção do sítio onde está. Por mim eram corridos não da sala, mas da própria Universidade.

terça-feira, abril 13, 2010

Das Leis e da Palavra

Os politicos confessam, que menos criminoso achauam os Romanos o quebrantar da ley, q̃ da palaura, dando por razam, que naquella se offendia a homẽs, & nesta a Deos; & assy se persuadio Seneca, q̃ nam podia perder a palaura, se nam aquelle que a nam tiuesse; sendo tam prejudicial o dano, que resulta, q̃ faz obrar a falta da palaura quanto se nam atreuera o poder da tyrannia.


Pantaleão Rodrigues Pacheco (m. 1667)
Discursos, que se presentaram na Curia Romana, por que se mostra que... Dom Miguel de Portugal Bispo de Lamego avia de ser recebido em aquella corte, como Embaixador do Serenissimo Rey de Portugal, Dom Ioam o IV nosso Senhor. Traduzidos de italiano em portuguez. Anno de 1642.

segunda-feira, abril 05, 2010

de 'A pequena face'

Caravaggio: João Baptista
entende que te ouço quando o corpo
abre na noite os flancos
quando oculta o pavor
as asas de ouro

quando mais nu que a água acordas
na brancura
e fere
o incessante

olhas e
a tempestade varre
a desabrigo

quando se rasga o ar
a boca movediça
fonte escura

António Franco Alexandre

domingo, abril 04, 2010

Benzer o Mar


Lisboa, 1581. O Conde da Ericeira narra os primeiros acontecimentos nefastos após a subida ao trono de Portugal de Filipe II de Castela.

«Os castigos dos que falavam qualquer palavra contra o govêrno, e dos que não haviam servido el-rei na conquista do reino, eram tantos, ainda que ocultos, que se não perdoava nem aos religiosos; porque aquêles a que a tirania supunha delinqüentes, eram arrebatados de improviso, e levados à Tôrre de São Gião, donde os lançavam ao mar, que não querendo ocultar tanto delito, trazia os corpos às rêdes dos pescadores, e retiravam-se delas os peixes, ofendidos do insulto, recusando ser mantimentos de homens, que mudando as disposições de Deus, lhes queriam dar homens por alimento. E foi necessário que, à instância dos pescadores, o Arcebispo de Lisboa fôsse em procissão benzer o mar, profanado com tantos sacrilégios, para que êle (como sucedeu) tornasse a pagar o tributo do peixe que dantes costumava. (*)

Conde da Ericeira, História de Portugal Restaurado. Livraria Civilização, 1945. Vol. I, p. 52

Imagem: Jean-Jacques Grandville - "Peixes pescando pessoas"

---
(*) Sigo a edição de António Álvaro Dória (1945), que está escrita na ortografia vigente nos anos 40, aquela em que, grosso modo, o Eduardo Lourenço foi alfabetizado, e na qual ele diz que continuará a escrever, naquela que foi uma das mais estúpidas e hilariantes tiradas contra o novo acordo ortográfico. Esperamos que tenha tido correctores ortográficos pacientes nas últimas décadas, já que a ortografia em que foi alfabetizado foi diversas vezes alterada até à forma actual, a que tantos se apegam, mas que tem pouco mais de 30 anos. Na verdade, a ortografia da edição de 1945 necessita de 7 (sete) alterações para ficar conforme aquela agora em vigor. Já se tivesse transcrito o texto usando a ortografia em vigor, não necessitaria de nenhuma alteração para ficar conforme o novo acordo.


sábado, abril 03, 2010

Where once the waters of your face

Where once the waters of your face
Spun to my screws, your dry ghost blows,
The dead turns up its eye;
Where once the mermen through your ice
Pushed up their hair, the dry wind steers
Through salt and root and roe.

Where once your green knots sank their splice
Into the tided cord, there goes
The green unraveller,
His scissors oiled, his knife hung loose
To cut the channels at their source
And lay the wet fruits low.

Invisible, your clocking tides
Break on the lovebeds of the weeds;
The weed of love's left dry;
There round about your stones the shades
Of children go who, from their voids,
Cry to the dolphined sea.

Dry as a tomb, your coloured lids
Shall not be latched while magic glides
Sage on the earth and sky;
There shall be corals in your beds
There shall be serpents in your tides,
Till all our sea-faiths die.


Dylan Thomas

quinta-feira, abril 01, 2010

Dos submarinos

A propósito das investigações sobre as alegações de corrupção no negócio dos submarinos, onde alegadamente estarão envolvidos o Portas e o Durão, estou curioso para ver se a Felícia Cabrita e o Sol vão investigar com a mesma sanha que têm usado contra o Sócrates. Imagino que não. Já quando à ex-deputada do CDS, Manuela Moura Guedes, se a espanholada não tivesse corrido com ela do Tempo de Antena do CDS de Sexta-Feira, tenho a certeza de que assobiaria para o lado, como sempre fez quando se trata de escândalos ligados à direita.