O André Benjamim lançou-me o desafio. Eu não costumo participar, mas abro uma excepção, em consideração ao meu homónimo, que gosto de ler. Além disso achei que era um bom pretexto para falar de uma das minhas mais recentes e intensas paixões, a língua e cultura árabe e islâmica.
O desafio é, pois, o seguinte:
O desafio é, pois, o seguinte:
"1. Pegue no livro mais próximo, com mais de 161 páginas – implica aleatoriedade, não tente escolher o livro;
2. Abra o livro na página 161;
3. Na referida página procurar a 5.ª frase completa;
4. Transcreva na íntegra para o seu blogue a frase encontrada;
5. Aumentar, de forma exponencial, a improdutividade, fazendo passar o desafio a mais 5 bloggers à escolha."
O problema é que o livro que tinha mais perto de mim era um dicionário "Árabe - Inglês", e supus que dicionários não contassem. Pensei então no segundo livro mais perto de mim, o Alcorão. Mas o desafio implica não escolher. Voltei então ao dicionário. Tive a esperança de que aparecesse uma definição interessante. Sei lá, um conceito filosófico ou religioso. Ou um verbo de implicações cognitivas. Ou uma preposição daquelas muito ricas em sentidos. Ou até um adjectivo bonito. Sei lá, qualquer coisa de jeito. Mas o que está na 5ª frase completa (entendida como definição) é o seguinte:
"كاحل kahil (كواحل kawahil) ankle"
Bom, o difícil agora é escolher 5 pessoas. Mas aqui vai:
André (O melhor blog do universo)
Cláudio (claudiofranco.net v. something)
Firefly (Staré mesto)
Mariana (Clube das leoas)
Pedro (Reflexos meus)
Aprender árabe foi um dos maiores desafios a que me propus nos últimos anos. Não tanto pela proverbial (e até certo ponto real) dificuldade da língua, mas por três factores que ma tornaram irresistível.
1. O facto de não ser uma língua indo-europeia. Até agora só tinha aprendido línguas indo-europeias: inglês, francês, latim, grego clássico e espanhol (por ordem cronológica). Por mais estranhas que aparentem ser, há sempre um determinado número de características fundamentais que as unem, ao nível morfo-sintáctico. Por mais bizarro que possa parecer o sistema verbal grego clássico, ele obedece, no essencial, aos mesmos princípios do nosso. Mas com o árabe não se passa nada disto. É necessário esquecer praticamente tudo o que se sabe sobre línguas. Lembra a alguém, por exemplo, que animais ou coisas no plural levem uma concordância de adjectivo no feminino singular?
2. O facto de ser uma língua sagrada. O estudo do árabe não se pode dissociar do Islão, ainda que haja um número significativo de arabófonos de religião cristã ou judaica. É que o árabe que aprendo, o árabe padrão usado nos "media", literatura e relações internacionais, não é outro senão o árabe do Alcorão, fixado há 14 séculos, apenas com alguns neologismos impostos pela evolução tecnológica. Eu não sou muçulmano nem imagino que venha alguma vez a ser. Sou ateu. Mas as religiões fascinam-me, e por isso talvez tenha lido o Novo Testamento mais vezes do que a esmagadora maioria dos cristãos. O Islão, tão pouco e mal conhecido no Ocidente, sempre me fascinou. Esta é uma oportunidade única de o conhecer melhor, e com a possibilidade de ler os seus textos fundadores no original.
3. O facto de ser uma língua quase imutável. Como ficou dito em cima, o árabe padrão moderno é o árabe fixado por Maomé no Alcorão, no século VII d.C., apenas com alguns neologismos impostos pela evolução tecnológica. Mas a sintaxe, a morfologia, a generalidade do léxico, são os mesmos num jornal do Cairo ou numa Sura do Alcorão. É quase como se nos jornais portugueses se escrevesse à maneira de Fernão Lopes, ou, levando um pouco mais longe o símile, como se o telejornal fosse dito em latim. Evidentemente não é este o árabe do homem da rua, que fala o que se convencionou, por razões políticas e religiosas, chamar dialectos, mas que na prática são línguas diferentes. Ora, tendo-me eu dedicado durante tantos anos ao estudo da filologia medieval hispânica, como poderia deixar escapar esta oportunidade de aprender a língua usada, com quase nenhumas alterações, no al-Andalus medieval?
3 comentários:
Da cultura árabe, só conheço "As Mil e Uma Noites" e o Al Corão, que li convenientemente traduzidos para português... Boa aprendizagem! Abraço
Mas eu também ando a ler o Alcorão em tradução. Quer dizer, em edição bilingue árabe-inglês. Leio o inglês, e depois olho para o árabe, versículo a versículo. O meu árabe ainda não dá para mais do que ler histórias para crianças, sempre com dicionário ao lado. É uma língua muito complexa para quem, como nós, está habituado ao sistema linguístico indo-europeu. Abraço!
Hoje fiquei muito contente ao encontrar este blog e descobrir que não sou o único maluquinho da Tugalândia a querer aprender Árabe...
Obrigado e bons estudos.
PS. felizmente não estou só!
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