terça-feira, fevereiro 22, 2011

Da elocução

Já tinha acontecido há uns anos, e até já contei algumas vezes. Na altura estava na praia a ler um volume de contos de Dostoiévski (tinha muito mais graça se fosse o "Crime e Castigo", mas não era), e umas miúdas que teriam uns 4 ou 5 anos interromperam a brincadeira e vieram pedir-me que lhes lesse "essa história". Embasbaquei uns segundos, mas lá me decidi, e pus-me a ler Dostoiévski às miúdas. Ao fim de menos de um minuto já elas voltavam à brincadeira, e eu calei-me, para prosseguir a "minha" leitura. Elas, no entanto, voltaram-se ao mesmo tempo, e berraram "continua" (ou "não pares", não me lembro bem).

Ontem não era Dostoiévski, mas a Vida de Rómulo, de Plutarco. O Manuel (4 anos), que até então estava entretido ao colo da mãe, pediu-me que lhe lesse "essa história". Eu obedeci, e durante alguns minutos lá lhe li as malfeitorias do fundador de Roma. Passado um pouco, quis ir ouvir pela enésima vez o "Pedro e o Lobo", do Prokófiev, mas às tantas, salvo erro quando o gato perseguia o passarinho, pediu-me para lhe ler de novo "a história do Rómulo".

Como nem me parece que as miúdas entendessem a prosa russa oitocentista, nem que o Manuel seja muito sensível à historiografia grega do séc. I d.C., a única moral que posso tirar daqui é que se calhar ando a perder tempo quando tento escolher com o máximo rigor os livros infantis para oferecer aos miúdos. Parece que lhes interessa sobretudo ouvir, não importa o quê.



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