terça-feira, março 24, 2009

Asma nas teclas



Quando me diagnosticou asma, a alergologista pediu-me que fizesse uma série de exames. Um deles media a minha capacidade respiratória. Quando lho entreguei, despejou o nariz na papelada e regougou se por acaso sentia dificuldades respiratórias. Respondi-lhe que não, que sempre tinha respirado bem. Alvejou-me com um dos olhos, e berrou triunfante que eu sempre tinha tido problemas respiratórios, mas que como não tinha uma referência de comparação, achava que respirava bem. Era como se sempre tivesse visto o mundo a 2 dimensões e alguém me tentasse explicar como é o mundo a 3 dimensões. Apenas poderia fazer uma pequeníssima ideia.

Vem isto a propósito de mais uma aventura a utilizar um computador com Windows. Familiares e amigos não conseguem compreender porque é que bufo, resmungo, suo e às vezes até grito quando tenho de ser submetido a tal prova. Aos meus desesperados "esta merda nunca mais abre" respondem com "mas até está a abrir depressa" perplexos. Quando ao fim de 10 segundos de espera para encerrar o computador me impaciento, não conseguem entender o meu bufar irado. Se um programa deixa de responder e rebenta, parece-lhes tão natural como lavar os dentes ao deitar, e não concebem a razão do meu espanto e revolta.

No fundo é como eu com a minha asma: não tendo ponto de referência, achei sempre que respirava tão bem como um atleta de alta competição, e no fim tinha pouco mais do que a capacidade respiratória de um velho de 90 anos.

Lembrei-me de novo de tudo isto quando tentava em desespero consultar o meu email, no Windows da minha irmã. Ao fim de várias tentativas e murros furibundos no teclado consegui, não sem antes ter sido forçado a reiniciar o Firefox e o IE duas ou três vezes. Eu estou habituado, no meu Linux, a carregar no ícone do Firefox e ele abrir sem que eu tenha tido tempo de largar o rato. Depois de conseguir por fim que o IE estabilizasse, abri o Blogger para começar a escrever esta entrada. Desisti a meio da segunda linha, exasperado com o rosnar constante do disco, com o folclore das luzinhas de actividade a cegar-me, com o cursor a bloquear regularmente durante alguns segundos. Carreguei então várias vezes na cruzinha para fechar a janela e bater com a porta do escritório da mana. Quando por fim o sistema se dignou obedecer-me, fui mastigar o bolo de anos do meu cunhado e ruminar irritações.

Agora, já no meu Linux, tudo obedece, em fracções de segundo. As luzinhas de actividade estão numa modorra imperturbável. O cursor não pára. O Firefox abriu tão depressa que quase podia jurar que ainda antes de clicar já estava aberto. E não consigo entender (e juro que me esforço) como é que há quem ainda prefira sistemas operativos caros ou pirateados, e que demoram o triplo, às vezes o quíntuplo, do tempo a fazer as mesmas coisas. Nem sempre com a mesma eficiência.

A minha mãe, que vai a caminho dos 63 anos, era uma dessas pessoas. Encarava os vírus, os programas bloqueados e a rebentarem sem explicação aparente, a lentidão exasperante, a gordura mastodôntica, encarava tudo isso com a mesma naturalidade com que sorve o seu chá nocturno. Um dia, e sem explicação (como é de regra), o seu Windows deixou de funcionar. Propus-lhe instalar um sistema Linux, até encontrar alguém que pudesse instalar-lhe mais um Windows. Cairam-lhe os olhos no chão de susto e bateu no peito em aflição: e o meu messenger? E o meu office? E o meu desktop?

Já se passaram vários meses. Usa o Pidgin, que faz basicamente o mesmo que o Messenger e usa a mesma lista de contactos, mas é menos pesado; o office é agora o OpenOffice, que faz a mesma coisa que o da Microsoft, mas é gratuito; o Firefox é o mesmo que já usava em Windows; o desktop, sendo diferente, faz a mesma coisa, e é mais intuitivo e configurável. Nunca mais me falou em querer o Windows de volta. E aposto que mais dia menos dia também ela bufará quando sofrer o suplício de ter de usar um sistema Windows.

Sem comentários: