Um dos eventos mais importantes do ponto de vista simbólico da Restauração foi o alegado despregar do braço de Cristo da cruz, no próprio 1 de Dezembro. O acontecimento é narrado em vários autores e documentos, logo em publicações de 1641. Inexplicavelmente o caso é desprezado pela historiografia contemporânea - e eu, enquanto agnóstico, estou à vontade para o lamentar. Milagre ou acaso (eu inclino-me naturalmente para a segunda hipótese), marcou profundamente as mentalidades da época, e foi usado e abusado pela propaganda restauracionista como prova do apoio de Deus à Casa de Bragança e ao Portugal Restaurado. O que em seguida se transcreve é a narrativa da História de Portugal Restaurado, do Conde da Ericeira, cujo primeiro volume saiu em 1679.
Conde da Ericeira (1632-1690), História de Portugal Restaurado, Vol. I, liv. II«(...) pegou D. Álvaro de Abranches na bandeira da cidade, seguiram-no todos, vieram buscar o arcebispo, e quando baixava, defronte da Igreja de Santo António, pouco distante da Sé, gritou o povo que uma imagem de prata de Cristo crucificado, que levava um capelão, a quem tocava, diante do Arcebispo, despregara o braço direito. As felicidades de Portugal e a justiça daquela acção podem persuadir que seria milagre; se sucedeu por acaso, foi pela ocasião muito misterioso. Gritou o povo prostrado por terra, que era milagre, e todos cobravam invencível confiança de que Deus aprovava a gloriosa deliberação dos confederados. Persuadidos de tão grande incentivo, não soavam em toda a cidade mais que vivas e aclamações ao novo Príncipe, valoroso autor da liberdade da Pátria.»
ed. António Álvaro Dória, Livraria Civilização, Porto, 1945. p. 124
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