
Sou só eu que acho, ou este homem tem mesmo um ar sinistro?

Soares nunca teve medo de dar a cara por aquilo em que acredita. Há quem diga que é louco por se arriscar a uma derrota histórica, depois de todo o capital de admiração e reconhecimento conquistado nas últimas décadas. Enganam-se. Não é o receio de uma eventual derrota que vai acobardar um homem que não teve medo da prisão e da tortura, quando se tratou de defender aquilo em que acreditava. Força Mário!

Apesar de toda a aparente contestação popular, apesar das medidas difíceis, apesar das virgens ofendidas das nomeações, o PS continua destacadíssimo nas intenções de voto, e menos de 2 pontos abaixo do resultado de Fevereiro - o que até está dentro da margem de erro. Eis os números da sondagem SIC/EXPRESSO/RR:
Muito se falou das "gaffes" de Soares. Sim, aquelas que ele comete publicamente há pelo menos 31 anos. Disse-se que era da idade. E as de Cavaco, que nas 2 ou 3 vezes em que abriu a boca nos últimos tempos foi só para sair asneira (bem, antes asneira que bolo-rei)? Primeiro foi a "Assembleia Nacional", agora diz que as próximas eleições são as autárquicas. Com isto chegamos a algumas questões interessantes:
A ascensão de Sócrates à liderança do PS ficou marcada pelo episódio do teleponto, no discurso da consagração. Aquilo que era uma atitude normal e usada por vários políticos em todo o mundo foi considerado sinónimo de impreparação e artificialismo. Se Sócrates tivesse levado o discurso em papel, não haveria tamanho chinfrim, apesar de na prática ser exactamente a mesma coisa.
A propósito, recorde-se o estado em que o seu consulado no Ministério das Finanças (1980-1983) deixou o país. Já sem falar no "monstro" criado durante os seus governos (1985-1995), o tal défice, que atingiu nessa altura valores altíssimos, mais até do que o défice deixado por Santana, e muito mais do que o défice deixado por Guterres. Por isso nem é de admirar as desfaçatez com que agora aparece como salvador da pátria, como se nada tivesse que ver com o actual estado do país. Já tinha feito o mesmo em 1985, aproveitando-se da memória curta do eleitorado português.
Percurso político de Cavaco Silva, aliás D. Sebastião:
Devo antes de mais dizer que nenhuma simpatia me move a favor de Manuel Maria Carrilho - nem de resto nenhuma antipatia. Se vivesse em Lisboa votaria no PS, porque é o partido com cujas propostas me identifico mais. E não, as eleições autárquicas não são só a escolha de um nome. Pensá-lo e afirmá-lo revela desconhecimento de como as coisas se processam, além de uma simplificação excessiva. Carrilho tem os seus defeitos, em algumas alturas discordei dele. Mas é um homem competente, determinado, fiel aos seus valores. E é o cabeça de lista, para Lisboa, do partido com que mais me identifico e em que sempre votei. Vem tudo isto a propósito do debate entre Carrilho e Carmona, ontem na SIC-Notícias. Foi um debate azedo e vivo, com ataques pessoais. Carmona parece ter deixado cair a máscara de homem afável e fora dos meandros da política - coisa, aliás, em que só alguém muito ingénuo ou que não acompanhe a política portuguesa pode acreditar. Em vez do engenheiro simpático e ingénuo que os seus apoiantes reatratam, o que vi foi um homem azedo, arrogante e mal-criado. Carrilho não foi um exemplo de bonomia, é certo. Mas não passou os limites da falta de educação. Carmona, pelo contrário, adoptou a postura do rufia mal-criado, com risinhos e tiradas a roçar o boçal. Confesso que até a mim espantou. Parece que até eu já tinha ido na propaganda mediática que diz que Carrilho é arrogante e Carmona afável. Não vi nada disso, ontem. Aliás, o desabafo de Carmona, depois de Carrilho não lhe ter apertado a mão (eu teria feito o mesmo), revela toda a sua má-criação. Não se chama "grande ordinário" a um adversário político, sr. Carmona, nem "off the record". Sobretudo depois do triste espectáculo dado.
O nosso Nélson é um dos apoiantes do candidato socialista à Câmara Municipal de Torres Vedras. É sempre bom saber que junta estas duas qualidades, sportinguista e socialista. Constou-me também de fonte do partido que ele é candidato a uma das juntas de freguesia do Concelho, embora em posição não elegível.
O primeiro-ministro disse ontem, dia 2, no Porto, que o concurso para colocação de professores já em 2006 será válido para 3 ou 4 anos. Se isto se confirmar, acho que são excelentes notícias para a classe docente, pois atenua-se um dos principais calvários do professor: contratos anuais, até efectivar, e correr o país de casa às costas. A notícia já saiu na "Última Hora" do Público, e vou colá-la aqui, porque o Público não costuma conservar por muito tempo as notícias em versão electrónica. Alguma coisa de boa que sai do Ministério da Educação, finalmente. Claro que tem o inconveniente de haver menos vagas por ano, mas por outro lado quem obtém colocação tem uma estabilidade profissional e pessoal incomparável. Aqui fica a notícia, então.
A direita, cada vez mais incomodada com a candidatura presidencial de Mário Soares, começa a lançar alguns falsos argumentos contra a sua candidatura. Dizem que, na actual conjuntura, é preciso um presidente com formação em economia ou finanças. No entanto, segundo a Constituição Portuguesa, o Presidente não governa... Esse papel pertence ao Governo! Portanto, de pouco ou nada servirá um presidente com formação em economia ou finanças, pois nenhuma das suas atribuições lhe permitirá pôr em prática esses conhecimentos. Também dizem que o seu tempo já passou, e que já é um homem velho. Bem, e o tempo de Cavaco, primeiro-ministro entre 1985 e 1995, não passou já também? E é algum rapaz novo, ele? Dizem também (e sem corar!) que Soares dará um mau presidente, pois confunde milhares com milhões (esta é da autoria do Marcelo), e não lê os "dossiers". Com esta fiquei confuso... Então mas este não é o mesmo Mário Soares que se considera ter sido um excelente presidente entre 1986 e 1996? Deixou de ler "dossiers" entretanto, foi? Eu sinceramente espero que sim, pois há coisas mais importantes e interessantes na vida do que ler "dossiers", e para isso é que existem os assessores, regiamente pagos, de resto, passe o paradoxo do advérbio neste contexto.
O PS esteve meses a fio - anos - sem candidato presidencial. No espaço de poucos dias, no entanto, surgiram três pré-candidatos passíveis de serem apoiados pelo partido: Freitas do Amaral, Manuel Alegre, Mário Soares, por ordem de aparecimento e de probabilidade. Com efeito, se Freitas se limitou a um "nunca digas nunca" e Manuel Alegre esboçou um "estou disponível", Soares afirma claramente que vai "reflectir e contactar sectores muito alargados da sociedade portuguesa". Esta presumível candidatura ("mais do que provável", dizia-se hoje na SIC-N) é sem sombra de dúvida a mais forte candidatura de esquerda, mesmo mais do que a de Manuel Alegre, que mais do que provavelmente fica assim abortada à nascença. Apesar de eu estar convencido de que Alegre tinha condições para vencer Cavaco, a imagem que estava a passar era a de que se tratava apenas de uma candidatura "para perder por poucos". Como se sabe, nada pior para uma candidatura de qualquer espécie do partir com essa ideia (apesar de a primeira vitória presidencial de Soares ser a excepção que confirma a regra). Com Soares é diferente. É o único candidato à esquerda que desde há muito tem uma imagem ganhadora, aparecendo em várias sondagens muito perto de Cavaco - a uma distância suficientemente curta para poder ser batida em pré-campanha e em campanha, com o reconhecido carisma de Soares, e a sua capacidade para mobilizar e concentrar multidões à sua volta. Lembro-me de fazer em 1985, com 14 anos, a campanha para a primeira volta. Lembro-me de ser o único miúdo da escola com um "crachá" do M.A.S.P., de ser uma espécie avis rara no meio do oceano freitista que tomava então conta de Portugal. Ou daquela noite em que fui com a minha mãe, quase clandestinos, a uma sessão de esclarecimento do PCP, onde se apelava ao voto em Soares contra Freitas - a minha mãe ia com um lenço na cabeça, para não ser reconhecida. Só quem não viveu aqueles anos é que pode achar estranho dois socialistas irem clandestinos a uma sessão do PCP. Lembro-me também da alegria incontida na noite da vitória, na segunda volta, daquelas pessoas todas na rua. Lembro de passar em frente à sede do PCP, e de haver centenas de comunistas a saltar e a chorar de alegria, a abraçar-nos. E só quem não se lembra do que era Portugal nos anos 80 é que não se espanta com isto. Lembro-me de ter acreditado sempre, mesmo quando os primeiros resultados davam percentagens esmagadoras para Freitas. Para quem não se lembra, na altura só a meio da noite apareciam as primeiras projecções, e aquilo que nos ia sendo dado eram resultados provisórios, que começavam em Macau e iam descendo de Norte para Sul. Ora era precisamente em Macau e no Norte que Freitas tinha os seus maiores apoios. Mas no fim a vitória sorriu-nos a nós, pessoal de esquerda. Então como agora todos apostavam na vitória do candidato da direita. Faço votos de que agora como então acabe por ser o candidato da esquerda - seja ele quem for - a vencer.
Marques Mendes elogiou hoje na RTP1 o ex-Ministro das Finanças, Campos e Cunha, dizendo que, apesar de não concordar com a subida do IVA, achava que ele estava a fazer um trabalho sério. Eu também acho. Pena que Marques Mendes não o tenha dito enquanto Campos e Cunha era ministro. Pena também que Marques Mendes não se tenha insurgido contra o aumento do IVA decretado pelo governo do seu partido, em 2002. Aliás é curioso como o PSD e o CDS hoje criticam ferozmente uma medida que o seu próprio governo decretou praticamente mal tomou posse.
Igualmente curioso foi o discurso de um comentador cujo nome não retive, na RTP-N. Dizia esse senhor que aparentemente Sócrates não permitia que houvesse no seu governo vozes discordantes, coisa que não lhe parecia bem, ao comentador. Depreende-se que se Sócrates as permitisse, na opinião desse comentador isso seria positivo. No entanto uma das maiores críticas que se fizeram a Santana Lopes foi precisamente o de qualquer ministro ter a sua opinião, nem sempre concordante com a do próprio primeiro-ministro, o que indiciava descoordenação. Também a Guterres se criticou o ser demasiado dialogante e tolerante. Em que é que ficamos, afinal? Pode haver vozes discordantes ou não? Deve haver uma disciplina férrea ou não?
Há quem ache que Durão Barroso insultou a cultura e língua portuguesas e deu um tristíssimo espectáculo de lambe-botismo, quando ao ser designado presidente da Comissão Europeia mudou o seu nome para José Barroso (ou coisa parecida), qual papa acabado de ser eleito em conclave, alegando entre risinhos subservientes que assim seria mais fácil para os jornalistas ingleses. Que injustiça! Ele já tinha descido ainda mais baixo quando, em 2002, apareceu no congresso do PP espanhol a gritar em bom portunhol "Viva la justiça! Viva la Espanha!" (ler à portuguesa), perante a consternação dos congressistas, que se entreolhavam como quem diz "Quién es? Qué lengua está hablando éste?".