sábado, agosto 15, 2009

Uma questão de higiene

Que fique desde já claro que sou ateu, e estou-me nas tintas para a maneira como os outros vivem e manifestam a sua religião, desde que não me prejudiquem. É a velha história de a minha liberdade terminar onde começa a do outro. Mais, não vejo mal nenhum em que mulheres muçulmanas usem se dor de livre vontade véus, burcas, o que bem lhes aprouver. De resto, das muçulmanas que conheço só duas usam véu, e fazem-no de livre vontade e por convicção (uma delas até é portuguesa).

Vem isto a propósito de uma notícia que vi ontem na televisão, enquanto bebia café. Era o caso de uma senhora muçulmana num país francófono (havia coisas em francês), que de um dia para o outro viu ser-lhe vedado o acesso a uma piscina, por usar fato de banho completo. Sem coragem para assumir as suas xeno e islamofobia, o director dizia que o fazia por questões de higiene.

Ora vamos lá ver se eu entendo isto. Segundo esse senhor, a utilização de um fato de banho que cobre na íntegra o corpo, com excepção da cara, e portanto impede o contacto de fluidos corporais (suor, por exemplo) e da pele com a água, viola as normas de higiene. Já a utilização de fatos de banho normais, que permitem o contacto de fluidos corporais e uma maior superfície de pele com a água, esses permitem uma utilização higiénica do espaço. Não estou a perceber.

2 comentários:

JP disse...

Por acaso também apanhei essa notícia. A minha reacção inicial foi idêntica à tua. Mas depois vi a entrevista com o responsável pela última piscina a proibir a senhora de nadar lá (já antes havia sido proibida de nadar com aquele fato-de-banho em duas piscinas públicas). O argumento do senhor era o seguinte: o "fato-de-banho muçulmano" poderia ocultar infecções na pele, feridas abertas, alergias, e todas aquelas moléstias cutâneas pouco desejáveis nos utilizadores de piscinas públicas. Também era proibido o uso de calções compridos no caso dos homens. A argumentação do senhor é sucinta e verdadeira: aquele fato-de-banho pode, de facto, ocultar doenças cutâneas. A senhora poderia muito bem nadar naquela piscina desde que respeitasse as normas do estabelecimento. Duas perguntas: 1) Parece-te discriminação religiosa exigir que os utilizadores de uma piscina cumpram o regulamento de higiene?; 2) Por que raio um canal português passa em horário nobre uma peça sobre uma senhora que foi impedida de utilizar uma piscina pública numa terriola francesa por não dispor do material desportivo adequado?

André . أندراوس البرجي disse...

Não sei, isso parece-me desculpa esfarrapada. Por várias razões, das quais destaco três:

- se a preocupação é com as ditas doenças de pele, o mesmo se aplica certamente às senhoras de fato de banho completo, que só deixam membros e pescoço à vela;

- se a preocupação é poder haver doenças escondidas, nada no Islão impede uma mulher de se despir diante de uma médica para que esta lhe passe um atestado em como não as tem;

- finalmente, e pegando com a primeira tipo pescadinha de rabo na dita, se as eventuais doenças estão debaixo dos braços, pernas ou pescoço do fato de banho total, não entram em contacto com a água, ergo...

A mim não me pareceria discriminação religiosa se de facto o pretexto da higiene se provasse verdadeiro e inabalável, no entanto, e porque a senhora pelos vistos já lá tinha ido com o dito fato completo sem que lhe pusessem obstáculos, não me parece que seja essa a razão. De resto, o Comité Olímpico Internacional não vê problemas em que nadadoras muçulmanas nadem assim, se o pretenderem. Esta desculpa da higiene é um pouco como se no Irão se proibissem as cristãs ocidentais de irem de biquini à praia, pois chamariam a atenção dos homens e isso causaria distúrbios. Sendo eventualmente verdade, não deixaria de ser discriminação religiosa.