O já muito referido e debatido caso da besta do Porto que atacou uma professora e foi filmada, bem como as notícias que agora surgem sobre a punição da criatura, levantam outra questão, que tem que ver com o tipo de punição que a escola reserva para casos de indisciplina.
Nascido em 1971, fiz o ensino secundário nos anos 80. Nesse tempo havia o hábito de premiar os alunos violentos e indisciplinados com suspensões de vários dias. Depois uma contínua (agora têm um nome complicado, mas é a mesma coisa) percorria as salas enunciando o nome dos suspensos, sob os nossos olhos frementes de admiração e alguma inveja. Os suspensos eram recebidos, após o exílio, como heróis intangíveis, e bem-aventurado aquele que conseguisse privar com eles. Eu andei 6 anos a tentar dar-me com alguém que tivesse sido suspenso, em vão. A verdade é que nunca fui muito popular, e o máximo que consegui foi uma ida para a rua, que me tornou heróis por alguns dias no espaço mais restrito da minha turma. Os alunos normais ou mais ou menos normais costumam agir assim, com admiração em relação aos rebeldes, aos perseguidos. Tanto lhes faz que sejam malcriados. E a punição, quando sob a forma de suspensão ou de ida para a rua, tem o mesmo efeito que a prisão de um resistente perante os seus compaheiros: longe de intimidar, acicata os ânimos, heroiciza o punido. Deixa de ser punição, é um prémio.
Lembro-me de, já professor, um aluno que decidiu, para gáudio excitado das meninas (e alguns meninos), abrir a braguilha e fazer um regaladíssimo xixi enquanto andava pelos corredores da escola, no intervalo grande da tarde. Entusiasticamente aplaudido, foi alcandorado à categoria de herói e mártir, quando se soube que o caso tinha sido levado ao Conselho Directivo. Alguns alunos confidenciavam-me, a voz cortada pela emoção, que se esperavam vários dias de suspensão. Não me lembro, francamente, se o rapaz era alguma coisa que se apresentasse (ou se terá exposto alguma coisa notável nesse fatídico dia), mas a verdade é que durante aqueles tempos se tornou, além de mártir, no ai-jesus das meninas. Até que veio a decisão oficial. O menino não era suspenso. Para consternação generalizada, não só lhe negavam a glória suprema da suspensão, como lhe atribuíam uma pena humilhante: lavar o chão e os quadros durante uma série de tempo, a horas de grande movimento, devidamente escoltado por uma contínua de porte cetáceo e pose germânica. Ao fim de poucos dias ninguém se lembrava já da história, a não ser quando o viam passar cabisbaixo de esfregona na mão.
Agora discute-se o que fazer à morcona do Porto. Pelo que se podia ouvir na gravação, já é uma heroína na escola. Fala-se agora de transferência. Para que escola, não sei. Mas não tenho dúvidas de que, a ser assim, será recebida como heroína intangível e inefável.
Nascido em 1971, fiz o ensino secundário nos anos 80. Nesse tempo havia o hábito de premiar os alunos violentos e indisciplinados com suspensões de vários dias. Depois uma contínua (agora têm um nome complicado, mas é a mesma coisa) percorria as salas enunciando o nome dos suspensos, sob os nossos olhos frementes de admiração e alguma inveja. Os suspensos eram recebidos, após o exílio, como heróis intangíveis, e bem-aventurado aquele que conseguisse privar com eles. Eu andei 6 anos a tentar dar-me com alguém que tivesse sido suspenso, em vão. A verdade é que nunca fui muito popular, e o máximo que consegui foi uma ida para a rua, que me tornou heróis por alguns dias no espaço mais restrito da minha turma. Os alunos normais ou mais ou menos normais costumam agir assim, com admiração em relação aos rebeldes, aos perseguidos. Tanto lhes faz que sejam malcriados. E a punição, quando sob a forma de suspensão ou de ida para a rua, tem o mesmo efeito que a prisão de um resistente perante os seus compaheiros: longe de intimidar, acicata os ânimos, heroiciza o punido. Deixa de ser punição, é um prémio.
Lembro-me de, já professor, um aluno que decidiu, para gáudio excitado das meninas (e alguns meninos), abrir a braguilha e fazer um regaladíssimo xixi enquanto andava pelos corredores da escola, no intervalo grande da tarde. Entusiasticamente aplaudido, foi alcandorado à categoria de herói e mártir, quando se soube que o caso tinha sido levado ao Conselho Directivo. Alguns alunos confidenciavam-me, a voz cortada pela emoção, que se esperavam vários dias de suspensão. Não me lembro, francamente, se o rapaz era alguma coisa que se apresentasse (ou se terá exposto alguma coisa notável nesse fatídico dia), mas a verdade é que durante aqueles tempos se tornou, além de mártir, no ai-jesus das meninas. Até que veio a decisão oficial. O menino não era suspenso. Para consternação generalizada, não só lhe negavam a glória suprema da suspensão, como lhe atribuíam uma pena humilhante: lavar o chão e os quadros durante uma série de tempo, a horas de grande movimento, devidamente escoltado por uma contínua de porte cetáceo e pose germânica. Ao fim de poucos dias ninguém se lembrava já da história, a não ser quando o viam passar cabisbaixo de esfregona na mão.
Agora discute-se o que fazer à morcona do Porto. Pelo que se podia ouvir na gravação, já é uma heroína na escola. Fala-se agora de transferência. Para que escola, não sei. Mas não tenho dúvidas de que, a ser assim, será recebida como heroína intangível e inefável.
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