terça-feira, março 11, 2008

A herdeira


Quando olho para as prateleiras que já me deixam pouco espaço em casa, vergadas (não é figura de estilo) sob o peso de alguns milhares dos livros que fui juntando desde a infância (muitos perderam-se ou foram emprestados, o que vai dar ao mesmo), tenho sempre um aperto na alma. Para onde irão, quando eu morrer. Se for em breve, serão partilhados entre a minha mãe e os meus irmãos. Se contudo prevalecer a estatística e só me libertarem daqui a uns 40 anos, fico sem saber o que lhes fazer. Filhos não tenho, e vir a tê-los é tão improvável como o Porto ser condenado com descida de divisão na sequência do Apito Dourado. Restam-me os sobrinhos, os que já cá estão e os que poderão vir a nascer. E nisso reside a minha esperança. A Carolina, do alto dos seus caprichosos 2 anos e meio, até agora tem-se revelado uma bibliómana capaz de me vir a fazer frente. Não vai para lado nenhum sem um livro, que prefere a qualquer brinquedo, mesmo se tiver poucas ou nenhumas imagens, e mais do que pedir-nos para desenhar, pede-nos para escrever.

Ontem foi pela segunda vez à Bertrand de Torres Vedras comigo. Na primeira vez foi a surpresa. Não sabia que havia lojas de livros. Ontem, mal vislumbrou a porta da livraria começou a dar guinchos de alegria, como só lhe tinha ouvido uma ou duas vezes. Correu para dentro da livraria e lançou-se, literalmente, aos livros infantis. Sentou-se, com um molho debaixo de cada braço, na mesinha colorida da secção infantil, e só com muitas súplicas a consegui arrancar de lá. É neste momento a candidata mais bem colocada para herdar estes milhares de livros que me tiram o sono. No melhor dos sentidos.

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