terça-feira, dezembro 28, 2010
Uma antena, por favor
sábado, dezembro 18, 2010
Perguntas difíceis
sábado, dezembro 04, 2010
Dos futebolistas cansados
Admito, concedo, há muitas diferenças entre um futebolista profissional e eu. Não vou escudar-me atrás disso.
O futebolista profissional tem uma dieta rica e energética. Eu vivo de bróculos cozidos e pescada cozida e alguma fruta e dois pãezinhos por dia, porque mais do que isso e a balança dispara.
sexta-feira, dezembro 03, 2010
Das bibliocousas
quarta-feira, dezembro 01, 2010
Soubesse a espanholada a choldra em que isto se tornaria e não teria sido preciso andar depois à bulha quase 30 anos
sexta-feira, novembro 26, 2010
mens uix sana in corpore sano
quarta-feira, novembro 24, 2010
O desassossego do pedante
domingo, novembro 21, 2010
O trabalho liberta peso
domingo, outubro 24, 2010
Banhoca
quinta-feira, outubro 21, 2010
Semana da Turquia na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa
sábado, outubro 09, 2010
Da competência, outra vez
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(*) Queixamo-nos da BN, mas ao menos essa tem data de reabertura marcada.
domingo, setembro 26, 2010
A praga do embaixador
Mi sono steso molto in questa materia, ma non tanto, come richiedeua la di lei necessità, e così riducendo il tutto a due sole parole, dico, Beatissimo Padre, col rispetto, che deuo al uero successor di S. Pietro, ma con quella libertà Christiana, che deuo ancora alla sua Catedra, che i mali caggionati dalle durezze passate, hanno bastato à perdere tante anime, che non sò se i due predecessori immediati di Vostra Santità hauran potuto allegare al Tribunal di Dio per scusa legitima di non hauer pasciuta quella gregge si numerosa per hauerli i Ministri del Re Cattolico sollecitati a non farlo, quando il precetto di Dio è si rigoroso al contrario, che Giesù Christo si dichiarò con suo Padre di non hauer trascurata pur una dell' anime à lui commesse: Quos dedisti mihi non perdidi ex eis quemquam. Ben sò, che nel morire ne sentirono acuti stimoli di rimorso, ma non permise Iddio, che chi haueua in uila trascurato si longamente negotio di tanta importanza lo rimediasse nel fine.
quinta-feira, setembro 16, 2010
Quid miraris?
Bem ia já mostrando Portugal a impaciência com o governo de Rei estranho no antecipado motim da cidade de Évora, confessando que não tinha já ombros para sustentar tão grande peso: e não deixa de ser mistério, o mover-se na era de trinta e oito. Esperava Portugal na era de quarenta ver-se restituído à glória de ter pai, e rei natural, faltavam-lhe naquele tempo dous anos para chegar à era de quarenta, que muito rompesse em motins, e inquietações! Trinta e oito anos havia, que um miserável paralítico padecia na mesma casa do Remédio; vem um Anjo a mover as águas, e só pera este pobre não havia lugar naquela piscina; impaciente com a opressão de tantos males rompe em brados e suspiros: non habeo hominem! E pera que estranha tanto os males, se tão feito está a padecê‑los? Grandemente Santo Agostinho: Quid miraris, quia languebat, quia ad quadraginta duos minus annos habebat? Estava o paralítico na era de trinta e oito anos de enfermidade, faltavam-lhe dous para chegar a quarenta, esta era a causa da sua impaciência: quid miraris, etc. Na era de trinta e oito vivia Portugal sujeiro à Coroa estranha, faltava-lhe dous anos para chegar a quarenta, em que havia de lograr Rei e Pai da pátria: que muito rompesse em motins, inquietações, quid miraris?
Frei Francisco Escobar
Sermão gratulatório pelo restabelecimento da saúde de D. João IV, 1655
ed.João Francisco Marques, A Utopia do Quinto Império e os Pregadores da Restauração, Quasi, Lisboa, 2007
terça-feira, setembro 14, 2010
Dos impostos
Estes (*) são os elementos de que se compõe a república. Da maneira, pois, que aqueles três elementos naturais deixam de ser o que eram, para se converterem em uma espécie conservadora das cousas: Ex eo, quod fuit, in alteram speciem commutatur; assim estes três elementos políticos hão de deixar de ser o que são, para se reduzirem unidos a um estado que mais convenha à conservação do reino. O estado Eclesiástico deixe de ser o que é por imunidade, e anime-se a assistir com o que não deve. O estado da Nobreza deixe de ser o que é por privilégios, e alente-se a concorrer com o que não usa. O estado do Povo deixe de ser o que é por possibilidade, e esforce-se a contribuir com o que pode; e desta maneira deixando cada um de ser o que foi, alcançarão todos juntos a ser o que devem; sendo esta concorde união dos três elementos eficaz conservadora do quarto. Vos estis sal terrae.
(*) o Estado Nobreza, o Estado Eclesiástico, o Estado do Povo.
Pe. António Vieira
Sermão de Santo António (Lisboa, 14 de Setembro de 1642)
domingo, setembro 12, 2010
Pescadores de reinos
Fomos pescadores astutos, fomos pescadores venturosos; aproveitámo-nos da água envolta, lançámos as redes a tempo, e ainda que tomámos somente um peixe rei, foi o mais formoso lanço que se fez nunca, não digo nas ribeiras do Tejo, mas em quantas rodeiam as praias do Oceano. Pescou Portugal o seu Reino, pescou Portugal a sua Coroa: advirta agora Portugal, que a não pescou para comer, senão para a conservar. Foi pescador, seja sal.
Sermão de Santo António (Lisboa, 14 de Setembro de 1642)
sábado, setembro 11, 2010
Deus nosso senhor castiga
Num lugar da Beira se afirma que ouue hum homẽ, que ouuindo dizer numa cõuersação que na felice aclamação delRey nosso Senhor fizera o crucifixo da Sè o milagre, que a todos he notorio: disse que podia a caso a imagem do Senhor despregar o braço; & assim como acabou de dizer estas palauras cahio huma parede junto da qual estauão todos os da cõuersação, & sò a elle matou.
Gazeta em que se relatam as novas todas, que ouve nesta Corte, e que vieram de varias partes no mes de Novembro de 1641
domingo, agosto 29, 2010
O levantamento de Portugal
Transcrevo respeitando a ortografia original, excepto nos casos de manifesto erro tipográfico.
Sahindo o Arcebispo da Sè na manhaã do Sabbado com os Conegos, fidalgos, & innumerauel gente, que se ajuntou em hum momento, leuaua diante hum clerigo a Cruz Archiepiscopal, chegãdo a jũto da porta da Igreja de Sancto Antonio, lhe pediraõ algũas pessoas lãçasse a bençã, elle pondo os olhos no Crucifixo lhe pedio quizesse bendiçoar aquelle Pouo. Dizẽ algũas pessoas que então despregou o Sancto Crucifixo a mão direita que tinha pregada na Cruz.
Porém o que todos viraõ olhando pera o Senhor neste passo, foi, que a mão direita estaua despregada, & com o braço em algũa distancia da Cruz, do que dantes ninguem dera fè, sabendose, que da Sé sahiraõ pregadas ambas as mãos com tarraxas. Com esta admirauel demonstraçaõ do Senhor, conceberaõ os prezẽtes mui grande consolaçaõ em suas almas, & a tiueram por claras prendas de o Senhor os auer de defender, & perpetuar na liberdade principiada.
Nos campos de Ourique mostrou Christo Senhor nosso claramente, que o leuantamento de Portugal a Reyno era obra sua, como dissemos no capitulo quinto da primeira parte, quando escolheo o Inuictissimo Rey Dom Affonso Henriquez para Rey de Portugal, e empenhou sua diuina palaura, que nele, & seus descẽdentes estabeleceria seu Imperio, & na decima sexta geraçam attenuada tornaria a por os olhos de sua misericordia.
Nesta Cidade de Lisboa, cabeça do Reyno desprega da Cruz o mesmo Senhor em publico sua mão direita leuantando com ella a Portugal attenuado, caido, & prostrado por terra, desempenhando desta sorte a palaura, que dera a seu primeiro Rey, pois em Principe Portuguez herdeiro de seu Real sangue, de nouo vẽ seus diuinos olhos estabelecendo, & confirmando nelle o Imperio Lusitano, conforme o prometera pelo Sancto Iob, operi manuum tuarum porriges dexteram.
(...)
A este admirauel sinal da mão direita do Senhor podemos atribuir a paz, & quietaçaõ, em que tudo ficou despois de Sua Magestade acclamado Rey, & naõ auer mais sangue, nem mais morte em hũa tam subita & nunca vista mudança de hum Reyno, estando viuo o possuidor delle.
Gregório de Almeida, Restauração de Portugal Prodigiosa, Lisboa, 1643
Parte II, cap. IV, pp.272-273.
domingo, agosto 22, 2010
Made in Portugal
sexta-feira, agosto 20, 2010
Uma questão de açúcar
terça-feira, agosto 17, 2010
Luz, & Calor
Lavra às vezes o lapidario hum diamante com muytas facetas miudas por cima (chamãolhe rosa): & de qualquer parte que bulís com elle está scintillãdo differentes brilhos. Tal me parece o ineffavel mysterio de Deos feyto Homem: hum diamante de valor inestimavel, que Deos amante meteo no dedo de sua Esposa a Igreja Santa; diamante tão fermoso, & claro, tão sem jaça, nem cabello, que tem dentro em si mesmo todo hum Sol de justiça: Orietur vobis Sol justitiae: & por qualquer parte que o consideremos, fere os olhos do entendimento com differentes luzes, todas manifestações da Divina, & ineffavel Caridade.Existe uma edição da Lello, de 1991, desta obra. Achei-a na Feira do Livro, mas nunca vi em nenhuma livraria.
Luz e Calor, II Parte, Op. I, Estímulos de Amor Divino: Estímulo V (p. 309 da edição de 1696)
Pe. Manuel Bernardes
domingo, agosto 15, 2010
Das referências
Felizmente vai-se impondo o hábito mais inteligente de nomear sempre o autor, e substituir a obra pela data de publicação, o que permite identificar rapidamente com uma ida à bibliografia. Isto no caso de obras impressas, pois nos manuscritos parece que se mantém a mesma técnica sádica. Quanto a mim, e correndo o risco de ser atacado por isso na defesa, na minha tese as citações são todas referidas ou pela data, ou, no caso de manuscritos ou impressos antigos, pela referência completa. Ah, e não há cá "idem, ibidem": mesmo em notas de rodapé seguidas, a referência vem sempre completa.
sábado, agosto 14, 2010
Só mesmo as que caíram no chão
segunda-feira, agosto 09, 2010
Da transfusão dos sonhos
sábado, julho 31, 2010
CSI: Bagdade
Não é o argumento de mais um CSI. É uma narrativa árabe medieval, retirada da edição bilingue Nouvelles policières du monde abbasside أخبار بوليسية من العصر العباسي , que recolhe pequenas histórias (verdadeiras micronarrativas) de autores do período abássida, desde al-Mas'udî (m. 956) a Ibn Arabshâh (m. 1450).
O título é, no entanto, enganador, pois na generalidade não são histórias policiais tal como as entendemos hoje, apesar do exemplo dado. São pequenas histórias que têm em comum o tema do crime, mas em poucas se desenrola verdadeiramente um argumento policial. O título é ainda mais enganador em árabe, ao recorrer a um francesismo ("bûlîsîya") em vez do radical árabe tradicional.
Apesar de tudo, é um livrinho a não perder, mais ainda quando se é estudante de árabe. O texto original está profusamente anotado e vocalizado, e no final há um apêndice gramatical e lexical. Melhor ainda, os textos são reapresentados em anexo, agora sem notas nem vocalização.
terça-feira, julho 27, 2010
segunda-feira, julho 26, 2010
Da ignorância
Da competência
sábado, julho 24, 2010
Da caligraphia
Por isso, depois de escrever 16 páginas à mão, para a tese, ontem e hoje, estou com três problemas graves. Primo, um calo doloroso no cotovelo direito, de o apoiar na cadeira enquanto escrevo. Secundo, uma vaga mas persistente moinha em todas as articulações da mão e braço direitos. Tertio et praesertim, 16 páginas pintalgadas de traços a lápis, que às vezes se parecem vagamente com lettras latinas, mas que rapidamente descambam para uma linha contínua com arrebiques, ondinhas e pintinhas, que vou ter uma tremenda difficuldade em entender, quando daqui a pouco começar a passá-las para o OpenOffice (eu cá não sou rico nem pyrata, só uso programmas gratuitos).
sexta-feira, julho 23, 2010
Dies Dominicus
Depois há os argumentos religiosos e morais, que se prendem com a ideia de que o Domingo é o dia do Senhor e que é para estar com a família. Ou seja, só o é para os trabalhadores de hipermercado, pois não vejo - FELIZMENTE - os mesmos argumentos serem utilizados para impor o encerramento de TODOS os estabelecimentos e serviços ao Domingo. Mas bastaria ser um argumento religioso a impor regras à sociedade civil, incluindo aos que, como eu, não são religiosos, bastaria isso para me opor frontalmente.
Há ainda o argumento de que se sacrificam os trabalhadores. Também aí há algo que não entendo. Partindo do princípio (não garantido) de que trabalham mais horas, não ganham mais também? E, de novo, por coerência não se devia aplicar a mesma objecção a todos os estabelecimentos e serviços abertos todos os dias?
Nada disto faz sentido para mim.
quarta-feira, julho 21, 2010
Do Serviço Nacional de Saúde
A sentença do médico foi peremptória: o meu nariz por dentro tem mais curvas do que a A8, é preciso operar. Pensei que não seria necessário dizer-lhe que não me dava jeito para já, que tinha uma merda de uma tese para entregar até Outubro. Achei que como era "no público" ia para uma lista de espera de meses ou anos, sendo uma intervenção sem qualquer urgência. Ainda assim, por descargo de consciência, disse a medo que não me dava jeito que fosse antes do fim do ano.
Achei que ele se ia rir na minha cara, e dizer qualquer cousa como "qual ano, 2011, 2012?". Mas não. Abanou a cabeça e disse que então não podia marcar já, porque o mais provável é que a operação fosse para dentro de um mês ou dois. Pasmei, e lá deixámos a cousa em águas de bacalhau da Terra Nova. No fim trocámos bacalhauzada, desejou-me boa sorte para o doutoramento, e acrescentou que no caso dele nem pensava em doutoramentos, pois queria era que o deixassem trabalhar. Eu assenti vigorosamente e lá me fui.
sábado, julho 17, 2010
Diego Ortiz - Recercada sobre la Folia
Diego Ortiz (1510-1570)
Recercada sobre la Folia
Interpretação: Jordi Savall
Diego Ortiz "Dixit Dominus" (Ps. 109)
Diego Ortiz (1510-1570)
Dixit Dominus
Interpretação: Cantar Lontano
Direcção: Marco Mencoboni
domingo, julho 11, 2010
Ainda a carroça e o Ferrari
Windows: depois de alguns cliques e várias janelas de diálogo, o software diz que vai demorar 16 minutos. No fim foi coisa de 5 ou 6.
Linux: um clique, dois cliques, alguns segundos (nem 20). Já está.
sexta-feira, julho 02, 2010
As tetas da loba
«O latim é uma língua muito subtil, toda de sons e de sentidos condensados, rebelde à grosseira tendência perifrástica das nossas línguas vulgares, que têm a mania de trocar tudo em miúdos. O célebre 'dente de coelho' dos padres-mestres não passa de um atestado da sua ignorância e preguiça. Bem dizia o meu mestre de latinidade, em Liège: "O latim não está no Magnum Lexicon: é cá uma coisa do sangue". Nem parece senão que o estou a ouvir: "La Louve tend ses tétines. Prends-y ton bien".»
Vitorino Nemésio, Mau Tempo no Canal
quinta-feira, julho 01, 2010
A fada dos arrotos
quarta-feira, junho 30, 2010
As carroças e os ferrari
terça-feira, junho 29, 2010
Das tempestades humanas
9. Arribar da viagem só pela inspecção das selagens não sucede ao Piloto de experiência. Os ameaços de algũa paixão não devem atemorizar a Nau de São Pedro, a fim de que se não dirija às importantes resoluções. Pode flutuar nas maiores ondas, mas não se pode perder nas tempestades humanas.
Balidos das Igrejas de Portugal ao Supremo Pastor Summo Pontifice Romano. Pellos tres Estados do Reyno, Paris, 1653
segunda-feira, junho 28, 2010
Brabos gigantes
Um cheirinho do início:
El Cauallero de la triste Figura DON QVIXOTE DE LA MANCHA, &c. Digo que como es notorio al mundo mi valor inuencible, lo sea tambien la Protestacion, y Reto, que por la presente hago, y es que despues del miserable castigo, que el Cielo ha dado a mi nacion Castellana en pena justa de su soberbia, embustes, y tirannias, reduziendola al mayor extremo de couardia, que jà mas ha encontrado Cauallero andante en la redondez de la tierra, con que vergonçosamente ha perdido su monarchia, y en particular despues de la misteriosa libertad de los Portuguezes nuestros aduersarios antigos, y increible corage, con que el Verano passado estos brabos gigantes, sin receber daño alguno, han por todas partes talado nuestros campos, quemado nuestros lugares, y muerto nuestras gentes ...
domingo, junho 27, 2010
Notas sobre o Mundial . III . Heil Lobo
Notas sobre o Mundial . II . Senhoras do Caravaggio
Notas sobre o Mundial . I . Antena 2
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(*) Aliás, é a única rádio que ouço, apenas com excepção da Antena 1 para os relatos de futebol.
sábado, junho 19, 2010
Das lombadas
Da ordinarice
quarta-feira, junho 16, 2010
Bloomsday 2010
He rested an innocent book on the edge of the desk, smiling his defiance. His private papers in the original. Ta an bad ar an tir. Taim imo shagart. Put beurla on it, littlejohn.
Quoth littlejohn Eglinton:
- I was prepared for paradoxes from what Malachi Mulligan told us but I may as well warn you that if you want to shake my belief that Shakespeare is Hamlet you have a stern task before you.
Bear with me.
Stephen withstood the bane of miscreant eyes, glinting stern under wrinkled brows. A basilisk. E quando vede l'uomo l'attosca. Messer Brunetto, I thank thee for the word.
James Joyce, Ulysses
sexta-feira, junho 11, 2010
segunda-feira, junho 07, 2010
quinta-feira, junho 03, 2010
O Corpo de Deus de 1647
A coisa conta-se em poucas palavras, e, apesar de quase completamente ignorada pela historiografia contemporânea, é fundamental na propaganda da Restauração. Mais, até ao século XIX ainda era fonte de inspiração de obras literárias, como "O Regicida", de Camilo Castelo Branco, e indirectamente as suas sequelas "A filha do regicida" e "A caveira da mártir".
No dia de Corpo de Deus de 1647, que nesse ano calhou a 20 de Junho, D. João IV comungou e foi à procissão, que percorria o que é hoje a Baixa de Lisboa. Alegadamente acoitado numas casas que teria alugado e cujas paredes teria derrubado para poder ter vista para os dois lados da rua, Domingos Leite Pereira esperava a passagem do rei para, alegadamente a mando de Castela, matar D. João IV (*). O rei lá foi à procissão, e voltou, imagino, para o regaço da sua Luisinha de Gusmão, no fim da dita. Então não houve tiroteio? Pois não. Alegadamente, Domingos Leite Pereira ter-se-á arrependido à última da hora, ao ver uma "majestade divina" pairando sobre o rei e que lhe teria paralisado os membros, impedindo-o de alvejar o Bragança - o que veio mesmo a calhar à propaganda quinto-imperista, que se fartou de escrever sobre isto. Confessou isto tudo em interrogatório, ou pelo menos assim diz a a crónica oficial, que acrescenta que o regicida frustrado, terá entoado loas a D. João IV, qual Saulo, aliás Paulo, depois da Estrada de Damasco.
Domingos Leite Pereira terá então fugido para Madrid, onde alegadamente terá prometido a Filipe IV que tentaria de novo matar o homem - e aqui não bate a bota com a perdigota: então se a criatura viu a tal majestade divina sobre o rei e lhe entoou louvores, então porque raio resolve que afinal vai tentar matar o homem de novo, o tal a quem entoou louvores e que viu ser protegido pelo seu Deus? Bom, mas é assim que reza a crónica oficial, e quem sou eu para contrariar Frei Francisco Brandão. (o Camilo arranjou uma versão muito melhor, mas o Camilo é o Camilo, eu sou eu).
Seja como for, em finais de Julho de 1647 Domingos Leite Pereira está de novo em Portugal, alegadamente para tentar matar D. João IV, outra vez. A tentativa não passa disso mesmo. Traído pelo companheiro, Roque da Cunha, é preso no dia 31 de Julho de 1647. Parece que confessou logo tudo, inclusive a história da majestade divina, que tão bem aproveitada seria pela propaganda do Quinto Império. Foram encontradas no lugar do crime que não aconteceu a escopeta e as balas embebidas em veneno. O que é muito conveniente, e revelador de que o moço era bastante distraído. Como a justiça naqueles tempos era célere, talvez demasiado célere, foi executado com requintes de crueldade no dia 21 de Agosto de 1647, apenas 2 meses depois do crime que não chegou a cometer.
O lugar onde não aconteceu o atentado está hoje em parte visível na Rua dos Fanqueiros, pois a rainha D. Luísa de Gusmão mandou que as casas fossem derrubadas e ali se fizesse um convento. Hoje apenas restam partes da igreja do convento, destruído em 1755.
A crónica oficial do acontecimento saiu logo em 1647, e é uma delícia propagandística. Recomendo vivamente os passos em discurso directo, sobretudo os atribuídos a D. João IV.
Um dos muitos textos que então se escreveram sobre o caso foi um sermão de Frei Luís de Sá, lente na Universidade de Coimbra, e que tem este delicioso título:
«Sermão que pregou o doutor Fr. Luís de Saa religioso da ordem de S. Bernardo, Lente da Cadeira de S. Thomas, e Gabriel da Universidade de Coimbra na procissão solemne que o Reverendíssimo Cabido do próprio bispado instituiu. Pro gratiarum actione, de Deus haver livrado a sua Majestade da admirável treição, que contra ele por ordem de Castela se tinha maquinado em dia de Corpus Christi.»
Foi pronunciado em Coimbra em 8 de Setembro de 1647, e publicado no mesmo ano - naquela época não se brincava em serviço, não havia cá as molezas e procrastinações dos nossos dias. Transcrevo dois parágrafos, modernizando a ortografia, mas conservando os casos em que a escrita denuncia formas de pronunciar diferentes das contemporâneas.
«Eu não me espanto por não ter este Salmo Autor ao certo, porque como é de um ânimo agradecido, e há tão poucos no mundo, não é novo não se lhe saber o nome, e acrescento que visto não ter este Salmo conhecidamente Autor, levado do protentoso milagre porque vimos render hoje as graças a esta santa Sé Catedral de Coimbra, com pública procissão, tão autorizada, que são estas palavras do Anjo Custódio do nosso Rei e Reino, falando expressamente com ele no Santíssimo dia de Corpus, defronte de nossa Senhora da Palma de Lisboa, quando Castela toda sempre falsa, com parte de Portugal traidor, capitaneados ambos do Diabo merediano, intentaram fazer alvo de suas setas, e tiros no pino do meio dia, a quem ia coberto do escudo da maior verdade, a custódia e âmbula do Santíssimo Sacramento.
Querem dizer as palavras do Anjo Custódio deste Reino falando com o Sereníssimo Rei nosso senhor Dom João o IV. A verdade do Senhor vos servira de escudo em toda a vida, não tendes que temer sombras nocturnas, nem setas que se derijam contra vós todos os dias: não façais caso de conselhos, e juntas de traidores, que no segredo da noite se maquinam contra vossa pessoa, que são acções de quem vive em trevas co juízo; finalmente tende grande ânimo, quando ao pino do meio dia vos virdes cometer do Diabo merediano com incurso diabólico.»
Fonte: impresso na Biblioteca Nacional, com a cota TR5661/19p
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quinta-feira, maio 27, 2010
Da mortificação do tacto
Exercicio de Mortificação para toda a SemanaSexta feira Mortifique o sentido do Tacto, pondo pela manhaã cilicio atè o jantar, se tiver saude; à noite disciplina por espaço de hum Miserere. Não se toque, nem se coce de advertencia. Não se veja ao espelho, nem parte alguma sua. Jejue, se puder, a pão, & agua; & visite tres vezes o Santissimo Sacramento, fazendo por ter dor de seus pecados; faça por andar cuidando este dia nas dores de meu Senhor Jesu Christo Crucificado.
Lisboa, 1684.
"... e é que, poucos dias antes do último correio, partido aos 13 de Novembro, se tinha ouvido em Lisboa um Jonas pregando: Adhuc quadraginta dies et Niniue subuertetur. Este homem, que pode ser que seja conhecido de V. S.ª, é um capitão, grande poeta vulgar, chamado antigamente António da Fonseca, o qual se meteu frade de S. Francisco haverá oito ou dez anos, e hoje se chama frei António das Chagas. Haverá dois ou três anos começou a pregar apostolicamente, exortando a penitência, mas com cerimónias não usadas dos Apóstolos, como mostrar do púlpito uma caveira, tocar uma campainha, tirar muitas vezes um Cristo, dar-se bofetadas, e outras demonstrações semelhantes, com as quais, e com a opinião de santo, leva após si toda Lisboa"
António Vieira, Cartas, ed. J. Lúcio de Azevedo, vol. III, INCM, 1997.
p. 144
quarta-feira, maio 26, 2010
Historiarum Lusitanarum ab anno MDCXL usque ad MDCLVII Libri Decem
terça-feira, maio 25, 2010
Do reinar e do servir
"A Duquesa, que era dotada de entendimento tão claro e ânimo tão varonil, como depois acreditaram largas experiências, ponderando os perigos da sua Casa, sendo objecto do rigor do Conde-Duque, julgou generosamente por mais acertado, ainda que a morte fosse consequência da Coroa, morrer reinando que acabar servindo, e animou o Duque, dizendo que todos os vaticínios eram segurança da empresa, e que neste sentido só a dilação de se coroar podia ser prejudicial."
D. Luís de Meneses, História de Portugal Restaurado, Vol. I
ed. António Álvaro Dória, Livraria Civilização, Porto, 1945, p. 111
segunda-feira, maio 17, 2010
domingo, maio 16, 2010
O Cardeal foi às putas
Um dos inimigos de estimação de Sousa Coutinho era o Cardeal Protector de Portugal, de seu nome Ursino. Numa carta de 22 de Abril de 1656, diz mesmo isto ao secretário Gaspar de Faria:
"Mas o que sobretudo sinto é o espanto que toda esta Corte tem desde o Papa até o mais ínfimo, de havermos escolhido um Protector, que é o ludíbrio dos Cardeais, e homem de quem no Colégio se não faz caso algum, e me dezia nestes dias um autorizado que me não espantasse disso, que começara a vida com a caça e com as putas sem tratar de outra cousa, que assim continuava ainda, e assim havia de acabar, e tal como isto é o Protector que temos."
Retirei o texto do Corpo Diplomático Português (volume XIII, página 285) actualizando a ortografia, excepto nos casos em que reflecte a pronúncia da época. A edição é a de 1907.
quarta-feira, maio 12, 2010
Da alparca de Deus, ou de como já não se fazem frades desta qualidade
Estes fidalgos homiziados que aqui andam o tomaram tão pesadamente que, se os eu deixara, queriam tirar satisfação do castelhano; aquietei-os com lhes dizer que de castelhanos não podíamos esperar outro tratamento: que no que se nos não dizia em nossa presença nos não faziam agravo algum, que a ser nela, que não só deles esperaria eu a boa conta que diriam de si, mas que de qualquer dos seus criados, como havia feito frei Francisco de Assis, que é um frade franciscano da Província de Enxobregas, irmão de Manuel Alves Carrilho, português tão desatinado que um destes dias em Ara Coeli, que é o convento em que está, porque houve um frade castelhano que quis usar dos mesmos termos do Duque de Bragança, saltou nele descalçando uma alparca, e moeu com ela de maneira que se lho não tiram das mãos, houvera de sair delas em muito mau estado: o Assis esteve preso alguns dias, mas pôs os castelhanos em estado que diante dele nenhum falava.Carta de Sousa Coutinho a D. João IV, de Agosto ou Setembro de 1656in Corpo Diplomático Português, vol. XIII
pp. 229 & seqq.
terça-feira, maio 11, 2010
Da mama de ir a Roma
O Reino está, pois, sem Bispos, sem reconhecimento internacional relevante (tirando a França), e à espera a qualquer momento que a Espanha resolva as outras guerras mais importantes, e ataque em força, de modo a recuperar isto. É neste contexto que D. João IV manda para Roma o embaixador Sousa Coutinho, então representante em Paris, para tentar que o novo Papa se dignasse recebê-lo. Inesperadamente, Sousa Coutinho, que chega a Roma em Novembro de 1655, consegue ser recebido menos de um mês depois. Mas a título particular, não oficial, o que é como quem diz: ficou tudo na mesma.
Apesar do fracasso relativo, Sousa Coutinho, que tinha um feitio dos diabos, está eufórico, e acha (e di-lo em carta ao Rei) que conseguiu num mês o que os outros não lograram em 15 anos. O que não deixa de ser verdade: tal como os outros, a bem dizer não conseguiu nada. Mas ele acha que não, acha que a cousa está arrumada (puro engano, só em 1669 se resolve o problema, já Sousa Coutinho estava morto e enterrado havia quase uma década). E numa das muitas e inflamadas cartas que escreve a D. João IV, saiu-se com esta pérola, que não lhe terá granjeado muitas simpatias entre o Clero, e que poderá explicar as más relações que manteve sempre com o Cardeal Protector do Reino, Ursino, e sobretudo o ter sido mandado regressar à base por D. João IV nesse mesmo ano:
O que [o Cardeal Ursino] escreve a Vossa Majestade que o Papa declarou, ou deu a entender que daria Bispos a Portugal, mas que não receberia Embaixador salva pace, cousa é que lhe não saiu nunca pela boca, são openiões (sic) vulgares, particularmente dos nossos frades portugueses, que como de haver Embaixador se segue por consequência infalível terem Núncio no Reino, e tirar-se-lhes a mama de virem a Roma a título de servirem a Vossa Majestade, andam apontando estes meios pelas praças, e pelas casas dos Cardeais.Carta de Sousa Coutinho a D. João IV, de 28 de Janeiro de 1656in Corpo Diplomático Português, vol. XIII
pp. 229 & seqq.
Modernizei a ortografia excepto quando reflecte a pronúncia da época. A edição é retirada do Corpo Diplomático Português, edição monumental, ainda que com muitos erros, que não é reeditada desde o século XIX, seguindo uma tradição muito portuguesa, de não reeditar obras de referência.
Nota: aquele senhor bem posto ali em cima é o Papa Alexandre VII (1655-1667)
sábado, maio 08, 2010
Dos livros que matam
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(*) Correctamente a transcição é al-Jâḥiẓ (الجاحظ). O nome é, na verdade, uma alcunha. A palavra significa qualquer coisa como "de olhos esbugalhados" - mal que ataca muito boa gente que gosta de ler.
quinta-feira, maio 06, 2010
Diálogo entre Babieca y Rocinante
«Diálogo entre Babieca y Rocinante
SonetoB. Cómo estáis, Rocinante, tan delgado?
R. Porque nunca se come, y se trabaja.
B. Pues qué es de la cebada y de la paja?
R. No me deja mi amo ni un bocado.
B. Andá, señor, que estáis muy mal criado,
pues vuestra lengua de asno al amo ultraja.
R. Asno se es de la cuna a la mortaja.
Queréislo ver? Miraldo enamorado.
B. Es necedad amar? R. No es gran prudencia.
B. Metafísico estáis. R. Es que no como.
B. Quejaos del escudero. R. No es bastante.
Cómo me he de quejar en mi dolencia,
si el amo y escudero o mayordomo
son tan rocines como Rocinante?»
Cervantes, Don Quijote de la Mancha
segunda-feira, maio 03, 2010
look the very boldest man
can scarcely dare to meet no matter
how he'll try to try)
So wrong(wrong wrong)and with a
smile at which the rightest man
remembers there is such a thing
as spring and wonders why
So gay gay gay and with a
wisdom not the wisest man
will partly understand(although
the wisest man am i)
So young young young and with a
something makes the oldest man
(whoever he may be) the only
man who'll never die
e. e. cummings
Boas informações
Da felicidade dos homens
«Yo sigo jugando a no ser ciego, yo sigo comprando libros, yo sigo llenando mi casa de libros. Los otros días me regalaron una edición del año 1966 de la Enciclopedia de Brokhause. Yo sentí la presencia de ese libro en mi casa, la sentí como una suerte de felicidad. Ahí estaban los veintitantos volúmenes con una letra gótica que no puedo leer, con los mapas y grabados que no puedo ver; y sin embargo, el libro estaba ahí. Yo sentía como una gravitación amistosa del libro. Pienso que el libro es una de las posibilidades de felicidad que tenemos los hombres.»
Jorge Luis Borges, Borges Oral, Alianza Editorial, 2006